Dia do azar é o caralho! Sexta-feira 13 é o Dia do Azarão!!!
E
pra cima do Azarão não cola mandinga, despacho, olho-grande nem olho
gordo, nome na boca do sapo nem na beiça da perereca, café coado em
calcinha, ziquizira nem praga de puta.
Vacino-me
todos os dias. Moro em um prédio de 3 andares, sem elevador. Todos os
dias, várias vezes por dia, ao iniciar minha subida pelos lances
inferiores da escada, passo embaixo, óbvio, dos degraus superiores;
passar embaixo de escadas é comigo mesmo. Tenho duas gatas, uma delas,
preta como a noite sem lua e café turco; ela cruza meu caminho todos os
dias, várias vezes por dia. Tenho anticorpos concentrados contra o azar.
Meu sangue é o próprio soro antiofídico contra a peçonha da má sorte.
Sou composto do próprio mau agouro, sou monolito, matéria escura, buraco negro de má probabilidade.
Só
uma coisa pode dar azar ao Azarão em uma sexta-feira 13 : trabalhar!
Assim sendo, valendo-me de minha condição de funcionário público, doei
sangue logo pela manhã e ganhei o dia todo de ociosidade. Doei sangue :
pesar (72 kg), medir a pressão (11 x 7), verificar hemoglobina (49%);
entrevista com enfermeira/assistente social - dormiu bem, viajou para
outras regiões, fez tatuagem, tomou vacina, está em tratamento dentário,
só transa com sua mulher, já transou com homem, recebeu sangue? -,
agulha pra cavalo na veia, drenagem de meio litro de sangue, lanchinho -
suco de manga, bolacha de água e sal e sanduíche de quase presunto e
muçarela - e as recomendações de evitar esforços físicos e,
principalmente, ingerir muito líquido, repor a seiva perdida.
Obediente
que sou, ao chegar em casa, pus-me a seguir as prescrições médicas.
Coloquei o toca-cd na mesa da sacada - só musicão antigo - pu-lo a tocar
e me sentei a ouvir velhas canções e a me hidratar. Água de coco?
Gatorade? À puta que pariu, que, assim como mau-olhado, viadagem também
não cola : três bons latões gelados da boa Itaipava, concebida das
cristalinas águas das serras de Petrópolis; em oferta nessa semana, R$
1,59 o latão, boa e barata. E o dia esteve de fato proprício a essas
pequenas e inofensivas licenciosidades, a fazer jus à sua fama :
nublado, chuvoso, cinzento.
Emborcando
um suco de cevada, ouvindo Adoniran, cabeça vazia, ateliê do diabo (e o
diabo que molda suas argilas e seus mármores em mim é um Michelângelo,
um Rodin), resolvi pesquisar a origem do azar injustamente atribuído à
sexta-feira 13.
Sempre
supus, dados os seus símbolos clássicos - bruxa, gato preto -, que
remontasse à Idade Média, à caça às bruxas, à satância Santa Inquisição
Católica. Errei. E gostei de errar. Surpreendi-me favoravelmente.
Não
é que, aparentemente, a origem da má fama da sexta-feira 13 remete à
mitologia nórdica, à patota do meu camarada Thor? Faz todo o sentido a
sexta-feira 13 ser o dia do Azarão e ter descendência nórdica. Sempre
fui muito mais afim da turma de Odin que da de Zeus. Não é à toa que há o
martelo de Thor no frontispício do Marreta, ameaçando marretar a cabeça
de deus e espalhar os miolos desse velho safado pelos confins do
universo.Similia similibus curantur. Tenho alma
escandinava! Só reencarnei, por artimanhas de Loki, o maldito, em
errôneas latitudes. Um asgardiano encarcerado em corpo cucaracha.
O azar atribuído à sexta-feira 13 nasceu de duas lendas nórdicas. De acordo com a primeira, Odin resolveu organizar uma reuniãozinha entre amigos, um comes e bebes, um rega-bofe no
Valhalla, a morada celestial dos guerreiros nórdicos, e convidou outros
doze deuses para a festa. Esqueceu-se de Loki. Loki, o filho anão dos
gigantes de gelo. Loki, o trapaceiro, o príncipe da mentira. Loki, filho
adotivo de Odin, meio-irmão de Thor. Sentindo-se preterido, talvez por
não ser filho legítimo de Odin, Loki reagiu ao bullying do
Pai Celestial : apareceu na festa sem ser convidado e armou um baita de
um quebra-pau cujo trágico desfecho levou à morte de Balder, o mais
belo dos deuses.Instituiu-se, então, a
superstição de que convidar 13 pessoas para jantar era desgraça na certa
e esse número ficou marcado como símbolo do azar.
Faz
sentido, isso de 13 comensais atraírem desgraça. Não eram igualmente
treze, os convivas da santa ceia, Cristo e mais doze apóstolos? E vejam
só o azar desgraçado que o cristianismo trouxe para o mundo.
A
outra lenda diz respeito à gostosíssima esposa de Odin, Frigga. Se bem
que nem precisava dizer que Frigga, deusa da fertilidade, amor e união,
era gostosíssima. Ou alguém acha que Odin, sendo o Todo-Poderoso do
panteão, iria desposar uma baranga? Uma troll de pernas e suvacos
cabeludos, uma integrante do Femen de Asgard? Segundo essa lenda, quando
as pagãs tribos nórdicas se converteram ao cristianismo, Frigga foi
decretada bruxa e exilada no alto de uma montanha. Em retaliação, Frigga
passou a se reunir, em todas as sextas-feiras, com mais 11 feiticeiras e
o próprio Satanás - num total de 13 participantes, portanto - para
rogar pragas sobre a humanidade. Que sortudo, o Satanás, uma orgia pagã
com 12 gostosas em todas as sextas-feiras. O nome Frigga deu origem aos
vocábulos friadagr e friday, sexta-feira em escandinavo e inglês, respectivamente.
Aliás,
eu não entendo a conversão dos povos pagãos ao cristianismo; na
verdade, não entendo a necessidade que a maioria tem de seguir uma
religião, qualquer que seja ela. Mas deixar uma religião que celebra a
natureza e suas forças, que tem a Vida, enfim, como deusa e doutrina,
para seguir outra que celebra a morte e o suplício? Deixar uma religião
que lida naturalmente com o corpo e seus desejos para seguir outra que o
demoniza e trancafia, carrega-o de culpa e pecado? Aí, é que eu não
entendo mesmo. No paganismo, tem festa do equinócio, do solstício, da
colheita etc etc, parece uma Bahia com neve, e tudo com muita comida,
muita bebida e todo mundo dançando pelado em volta da fogueira. Trocar
uma religião na qual a fogueira serve de lúmen e calor para amantes
copularem ao gélido ar livre por outra em que a fogueira serve para
queimar gente, é instrumento de pena de morte?
Dia
do azar é o caralho! Sexta-feira 13 é o Dia do Azarão. Matei o
trabalho, tomei uns bons latões de boa e barata cerveja, ouvi uns
musicões antigos, li um pouco de mitologia nórdica.
O
seguro, contudo, morreu de velho. Não creio em bruxas, mas que elas
existem, existem. Só para garantir, só por precaução, afinal, o Marreta é
objeto de muito quebranto, posto aqui dois dos amuletos mais infalíveis
contra o azar ; o trevo-de-quatro-folhas e o pé de coelho.
amarretadoazarao.blogspot.com
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