Colocados em disponibilidade após a extinção da Corte de Contas dos Municípios, alguns esperavam pela aposentadoria antecipada para exercer outras atividades, inclusive de caráter político-partidário visando à eleição.
Cercada por interesses políticos, a Assembleia Legislativa aprovou, ontem, por 38 votos a favor e apenas um contrário – do deputado estadual Heitor Férrer (SD) –, Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que antecipa a aposentadoria para conselheiros em disponibilidade do extinto Tribunal de Contas dos Municípios (TCM).
A proposta, que começou a tramitar em abril – em paralelo às discussões nacionais sobre mudanças na aposentadoria de milhares de brasileiros –, já estava pronta para ser votada em plenário desde o dia 21 de maio. Desde a extinção do TCM, em 2017, quatro dos sete conselheiros seguem em disponibilidade para ser aproveitados no Tribunal de Contas do Estado (TCE), que incorporou as atribuições da Corte de Contas dos Municípios: Pedro Ângelo, Manoel Veras, Marcelo Feitosa e Domingos Filho.
Os conselheiros Francisco Aguiar e Ernesto Saboia já se aposentaram. Já Hélio Parente pediu exoneração do cargo para assumir uma função no Governo do Estado e, depois, também pediu para sair. Enquanto isso, os quatro conselheiros do antigo TCM que estão em disponibilidade não assumiram vaga no TCE e continuam recebendo salários integrais de R$ 35.462,22, por se tratar de um cargo vitalício.
Antecipação
Alegando que os conselheiros não têm “perspectiva” de serem aproveitados no TCE e que estão “onerando” os cofres públicos do Estado, o deputado Osmar Baquit (PDT) apresentou a PEC, para conceder a eles uma aposentadoria “voluntária especial”. A remuneração, de acordo com a proposta, será proporcional ao tempo de contribuição.
Pelos cálculos de alguns deputados, os conselheiros que solicitarem a aposentadoria antecipada vão receber subsídios em torno de R$ 28 mil. Há questionamentos, porém, sobre mudanças feitas para atender, exclusivamente, aos interesses de alguns conselheiros.
Interesses
De acordo com a Constituição Federal, só podem se aposentar, voluntariamente, os conselheiros que tiverem, no mínimo, 65 anos de idade e 35 anos de contribuição – para homens – e 60 anos de idade e 30 de contribuição – para mulheres –; 10 anos de serviço público e cinco anos no cargo.
A PEC, no entanto, estabelece que esses requisitos não serão exigidos, beneficiando conselheiros que não atendem a esses critérios. Além disso, na condição de aposentados, eles poderão exercer outras atividades – e é justamente esse o principal interesse de alguns. A PEC, apresentada por Baquit, foi patrocinada pelo conselheiro Domingos Filho, que tem planos de presidir o PSD no Ceará, hoje, comandado pelo filho dele, o deputado federal, Domingos Neto.
Outro que se movimentou nos bastidores para articular a aprovação da PEC foi Hélio Parente. Isso porque, apesar de já ter deixado o cargo, a emenda estabelece que os conselheiros poderão se aposentar a partir da data em que o TCM foi extinto, em agosto de 2017. Naquela época, Hélio Parente foi posto em disponibilidade no cargo.</CW>
Atingidos
Domingos Filho, que não nega ter articulado apoio à proposta, classifica a aprovação como “justiça”. “Eu não faço nada às escondidas. Nós ficamos em uma situação atípica de nem ser aproveitado como julgador no TCE, nem poder se aposentar proporcionalmente e nem poder exercer as atividades privadas, então é uma punição sem causa”, argumentou.
Já Hélio Parente admite não ter ainda a idade mínima para ter direito à aposentadoria, mas nega influência na PEC. “A Assembleia é uma Casa autônoma”, disse. Por outro lado, o conselheiro Manoel Veras, que acompanhou a votação, não deverá ser atingido pela emenda. “Já tenho tempo suficiente para me aposentar. Naturalmente, tenho expectativa de poder vir a trabalhar que é o que mais nos interessaria”.
Repercussões
Para Heitor Férrer (SD), a PEC de Baquit é inconstitucional. Ele disse, na tribuna, ontem, que vai entrar com uma ação no Ministério Público Federal."Eu não posso votar em algo que é frontalmente contrário ao que a Constituição diz", justificou o voto contrário.
Autor da PEC, Osmar Baquit argumenta que não estão previstas na Constituição regras para casos de servidores em disponibilidade. “É uma omissão que está lá. Defendo uma economia para o Estado, pela possibilidade de antecipar a aposentadoria. Há um parecer da Procuradoria da Casa dizendo que é constitucional”. Uma emenda de autoria dele à PEC também foi aprovada, alterando o prazo de solicitação da aposentadoria voluntária de 90 para 180 dias.
Autorizadas mudanças no Poder Judiciário
Os deputados também aprovaram, ontem, projeto do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) que, originalmente, faz mudanças no Regimento Interno do Poder Judiciário, mas que também promoveu alterações, através de emendas, na nomeação de cargos e extinção deles. As alterações foram classificadas por deputados da oposição como “jabutis” e causaram polêmica no plenário.
O texto original trata do Regimento Interno e da disciplina dos recursos administrativos. No entanto, três emendas apresentadas por Evandro Leitão (PDT) causaram polêmica. Uma delas trata da autorização de juízes para a indicação de cargos comissionados, “não havendo servidor efetivo que preencha os requisitos legais para assumir para o cargo” ou quando o servidor não estiver interessado pela vaga.
Outra emenda autoriza o Tribunal de Justiça a extinguir cargos vagos, “sempre que necessário para racionalizar a adequada prestação jurisdicional”. E a terceira emenda de Evandro, aprovada ao projeto, trata da compensação financeira de plantão judiciário. Para Renato Roseno (Psol), os cargos comissionados devem ser preenchidos por, pelo menos, 50% dos servidores efetivos. Ele disse, em discurso, também, que autorizar o TJCE a extinguir cargos faria com que o Legislativo abrisse mão da sua prerrogativa.
Evandro Leitão defendeu que esses cargos só serão indicados quando não houver servidor efetivo suficiente e disse que o TJCE, se quiser, já pode extinguir cargos, por meio de resolução.
(Diário do Nordeste)
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