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terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Em carta, Temer diz que governo não confia nele


michel-temer
O vice-presidente da República, Michel Temer, enviou uma carta nesta segunda-feira, 7, à presidente Dilma Rousseff na qual relata uma série de episódios que demonstrariam, nas palavras dele, a “absoluta desconfiança” que sempre existiu em relação a ele e ao PMDB por parte da petista. O texto agrava a crise política no momento em que a presidente sofre um processo de impeachment. Para o Palácio do Planalto, o gesto é mais um passo do vice em direção ao rompimento com o governo.

Leia na íntegra a carta enviada por Temer a Dilma

Senhora Presidente,

“Verba volant, scripta manent”.

Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio. Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.

Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos. Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.

Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo.

Basta ressaltar que, na última convenção, apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, porque era eu o candidato à reeleição a vice.

Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo, usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido.

Isso tudo não gerou confiança em mim. Gera desconfiança e menosprezo do governo.

Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.

Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.

Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios, secundários, subsidiários.

A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil, onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho, elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.

No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas “desfeitas”, culminando com o que o governo fez a ele, ministro, retirando, sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) e que ele saiu porque faz parte de uma suposta “conspiração”.

Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de líderes e bancadas ao longo do tempo, solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.

De qualquer forma, sou presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me, chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu vice e presidente do partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.

Democrata que sou, converso, sim, senhora presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar.

Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o vice-presidente Joe Biden – com quem construí boa amizade – sem convidar-me, o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o vice-presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da “espionagem” americana, quando as conversas começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça para conversar com o vice-presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança.

Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica, sem nenhuma conexão com o teor da conversa.

Até o programa “Uma Ponte para o Futuro”, aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a economia e resgatar a confiança, foi tido como manobra desleal.
O PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como presidente do PMDB, devo manter cauteloso silêncio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.

Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o país terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.

Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB hoje, e não terá amanhã.

Lamento, mas esta é a minha convicção.

Respeitosamente,

À Sua Excelência a Senhora

Doutora DILMA ROUSSEFF

Presidente da República do Brasil

Palácio do Planalto

Brasília, D.F.

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