sábado, 14 de março de 2015

Sexta-Feira 13, o Dia do Azarão



Dia do azar é o caralho! Sexta-feira 13 é o Dia do Azarão!!!
E pra cima do Azarão não cola mandinga, despacho, olho-grande nem olho gordo, nome na boca do sapo nem na beiça da perereca, café coado em calcinha, ziquizira nem praga de puta. 
Vacino-me todos os dias. Moro em um prédio de 3 andares, sem elevador. Todos os dias, várias vezes por dia, ao iniciar minha subida pelos lances inferiores da escada, passo embaixo, óbvio, dos degraus superiores; passar embaixo de escadas é comigo mesmo. Tenho duas gatas, uma delas, preta como a noite sem lua e café turco; ela cruza meu caminho todos os dias, várias vezes por dia. Tenho anticorpos concentrados contra o azar. Meu sangue é o próprio soro antiofídico contra a peçonha da má sorte.
Sou composto do próprio mau agouro, sou monolito, matéria escura, buraco negro de má probabilidade.
Só uma coisa pode dar azar ao Azarão em uma sexta-feira 13 : trabalhar! Assim sendo, valendo-me de minha condição de funcionário público, doei sangue logo pela manhã e ganhei o dia todo de ociosidade. Doei sangue : pesar (72 kg), medir a pressão (11 x 7), verificar hemoglobina (49%); entrevista com enfermeira/assistente social - dormiu bem, viajou para outras regiões, fez tatuagem, tomou vacina, está em tratamento dentário, só transa com sua mulher, já transou com homem, recebeu sangue? -, agulha pra cavalo na veia, drenagem de meio litro de sangue, lanchinho - suco de manga, bolacha de água e sal e sanduíche de quase presunto e muçarela - e as recomendações de evitar esforços físicos e, principalmente, ingerir muito líquido, repor a seiva perdida.
Obediente que sou, ao chegar em casa, pus-me a seguir as prescrições médicas. Coloquei o toca-cd na mesa da sacada - só musicão antigo - pu-lo a tocar e me sentei a ouvir velhas canções e a me hidratar. Água de coco? Gatorade? À puta que pariu, que, assim como mau-olhado, viadagem também não cola : três bons latões gelados da boa Itaipava, concebida das cristalinas águas das serras de Petrópolis; em oferta nessa semana, R$ 1,59 o latão, boa e barata. E o dia esteve de fato proprício a essas pequenas e inofensivas licenciosidades, a fazer jus à sua fama : nublado, chuvoso, cinzento.
Emborcando um suco de cevada, ouvindo Adoniran, cabeça vazia, ateliê do diabo (e o diabo que molda suas argilas e seus mármores em mim é um Michelângelo, um Rodin), resolvi pesquisar a origem do azar injustamente atribuído à sexta-feira 13.
Sempre supus, dados os seus símbolos clássicos - bruxa, gato preto -, que remontasse à Idade Média, à caça às bruxas, à satância Santa Inquisição Católica. Errei. E gostei de errar. Surpreendi-me favoravelmente.
Não é que, aparentemente, a origem da má fama da sexta-feira 13 remete à mitologia nórdica, à patota do meu camarada Thor? Faz todo o sentido a sexta-feira 13 ser o dia do Azarão e ter descendência nórdica. Sempre fui muito mais afim da turma de Odin que da de Zeus. Não é à toa que há o martelo de Thor no frontispício do Marreta, ameaçando marretar a cabeça de deus e espalhar os miolos desse velho safado pelos confins do universo.Similia similibus curantur. Tenho alma escandinava! Só reencarnei, por artimanhas de Loki, o maldito, em errôneas latitudes. Um asgardiano encarcerado em corpo cucaracha.
O azar atribuído à sexta-feira 13 nasceu de duas lendas nórdicas. De acordo com a primeira, Odin resolveu organizar uma reuniãozinha entre amigos, um comes e bebes, um rega-bofe no Valhalla, a morada celestial dos guerreiros nórdicos, e convidou outros doze deuses para a festa. Esqueceu-se de Loki. Loki, o filho anão dos gigantes de gelo. Loki, o trapaceiro, o príncipe da mentira. Loki, filho adotivo de Odin, meio-irmão de Thor. Sentindo-se preterido, talvez por não ser filho legítimo de Odin, Loki reagiu ao bullying do Pai Celestial : apareceu na festa sem ser convidado e armou um baita de um quebra-pau cujo trágico desfecho levou à morte de Balder, o mais belo dos deuses.Instituiu-se, então, a superstição de que convidar 13 pessoas para jantar era desgraça na certa e esse número ficou marcado como símbolo do azar.
Faz sentido, isso de 13 comensais atraírem desgraça. Não eram igualmente treze, os convivas da santa ceia, Cristo e mais doze apóstolos? E vejam só o azar desgraçado que o cristianismo trouxe para o mundo.
A outra lenda diz respeito à gostosíssima esposa de Odin, Frigga. Se bem que nem precisava dizer que Frigga, deusa da fertilidade, amor e união, era gostosíssima. Ou alguém acha que Odin, sendo o Todo-Poderoso do panteão, iria desposar uma baranga? Uma troll de pernas e suvacos cabeludos, uma integrante do Femen de Asgard? Segundo essa lenda, quando as pagãs tribos nórdicas se converteram ao cristianismo, Frigga foi decretada bruxa e exilada no alto de uma montanha. Em retaliação, Frigga passou a se reunir, em todas as sextas-feiras, com mais 11 feiticeiras e o próprio Satanás - num total de 13 participantes, portanto - para rogar pragas sobre a humanidade. Que sortudo, o Satanás, uma orgia pagã com 12 gostosas em todas as sextas-feiras. O nome Frigga deu origem aos vocábulos friadagr e friday, sexta-feira em escandinavo e inglês, respectivamente.
Aliás, eu não entendo a conversão dos povos pagãos ao cristianismo; na verdade, não entendo a necessidade que a maioria tem de seguir uma religião, qualquer que seja ela. Mas deixar uma religião que celebra a natureza e suas forças, que tem a Vida, enfim, como deusa e doutrina, para seguir outra que celebra a morte e o suplício? Deixar uma religião que lida naturalmente com o corpo e seus desejos para seguir outra que o demoniza e trancafia, carrega-o de culpa e pecado? Aí, é que eu não entendo mesmo. No paganismo, tem festa do equinócio, do solstício, da colheita etc etc, parece uma Bahia com neve, e tudo com muita comida, muita bebida e todo mundo dançando pelado em volta da fogueira. Trocar uma religião na qual a fogueira serve de lúmen e calor para amantes copularem ao gélido ar livre por outra em que a fogueira serve para queimar gente, é instrumento de pena de morte?
Dia do azar é o caralho! Sexta-feira 13 é o Dia do Azarão. Matei o trabalho, tomei uns bons latões de boa e barata cerveja, ouvi uns musicões antigos, li um pouco de mitologia nórdica.
O seguro, contudo, morreu de velho. Não creio em bruxas, mas que elas existem, existem. Só para garantir, só por precaução, afinal, o Marreta é objeto de muito quebranto, posto aqui dois dos amuletos mais infalíveis contra o azar ; o trevo-de-quatro-folhas e o pé de coelho.
amarretadoazarao.blogspot.com

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